O assassinato dos trabalhadores pela MP nº 927/2020

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O assassinato dos trabalhadores pela MP nº 927/2020

Por Fábio Lemos Zanão*

Foi num domingo, primeiro dia da semana e considerado pelos Cristãos como um dia a ser reservado ao Senhor, que o Messias – que se intitula Cristão – deu mais um duro golpe, condenando à morte todos os empregados da nação.

Na calada da noite, e com o poder de sua caneta “Bic”, que mais golpe foi proferido contra centenas de milhares de trabalhadores num momento em que a classe mais precisava.

Agora, se não morrer de Coronavírus, morre do vírus Bolsonaro!

Isto porque não precisa ser jurista para entender que a MP 927, de 22 de março de 2020, que dispõe sobre medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública, da forma como editada, fere não apenas a Constituição Federal brasileira mas, principalmente, os direitos dos trabalhadores que ficam à mercê da benevolência de seu senhorio.

É inconteste que em decorrência da pandemia e do atual momento em que o planeta atravessa, medidas governamentais devem ser tomadas para que as empresas tenham fôlego para suportar o futuro que nos espera e, sem dúvida alguma, manter a roda da economia girando passa a ser também questão de necessidade pública.

Todavia, instituir um verdadeiro estado anárquico, através de uma medida provisória inconstitucional e desprovida de bom senso e coerência é, sem dúvida alguma, fomentar ainda mais o caos!

Inconstitucional porque a Constituição Federal, em seu artigo 7º, inc.VI, dispõe:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo.

Sendo assim, percebe-se claramente que o artigo 2º da MP 927, de bate-pronto, viola a Constituição Federal e traz ainda mais insegurança jurídica a empregados e empregadores.

Como se não bastasse, a CLT, em seu artigo 468, também traz que “Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

A mesma CLT, em seu artigo 503, ensina que “ É licita, em caso de força maior ou prejuízos devidamente comprovados, a redução geral dos salários dos empregados da empresa, proporcionalmente aos salários de cada um, não podendo, entretanto, ser superior a vinte e cinco por cento, respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo da região.

Todavia, a malfadada MP 927/20, de forma sorrateira e camuflada de “qualificação” do trabalhador, autoriza que o empregador possa suspender por até 120 dias o contrato individual de trabalho; o que significa que referido trabalhador, por exclusivo critério do seu empregador, poderá ficar sem receber salário ao longo de todo esse período em troca de uma ajuda compensatória!

É importante salientar que há lei específica que prevê que, em situações como a que estamos vivenciando – Lei 4923/65 – é possível sim a redução salarial proporcional de até 25% com a redução da jornada de trabalho, mediante prévio acordo coletivo ou convenção coletiva, por um período de até 3 meses, prorrogáveis se necessário for, respeitado o salário mínimo regional.

Por fim, a referida medida “fecha o caixão” dos empregados quando, em seu artigo 30 traz que os acordos e as convenções coletivas, vencidos e vincendos, no prazo de 180 dias a partir da MP, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de 90 dias; ou seja, numa interpretação reflexa, a categoria que não tiver acordo ou convenção vigente ou renovada, ficará a bel prazer de um senhorio benevolente, pois todos os direitos conquistados perderão eficácia!

As demais disposições da MP 927/20 já se encontram, em muitas categorias, disciplinadas em sede de acordo coletivo ou convenção coletiva sendo, em muitos aspectos, desnecessárias para que fossem enfrentadas através de uma medida provisória emergencial.

Infelizmente, contrariando a Constituição Federal, a legislação vigente e as inúmeras recomendações do Ministério Público Federal, o Messias, mais uma vez, utiliza-se de um estado de calamidade pública para disseminar, ainda mais, seu vírus – o da ignorância e total desrespeito aos trabalhadores deste país! Que Deus nos ajude!

* Fábio Lemos Zanão é formado pela Universidade São Judas Tadeu; Mestre em Direito Civil Comparado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP); Pós-graduado em Direito Difusos e Coletivos pela Escola Superior da Advocacia (OAB/SP); Professor Universitário; Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP). Sócio-responsável pela área de Direito Civil e Difusos e Coletivos do escritório, com ampla experiência com a imprensa.

Sobre o escritório Zanão e Poliszezuk Advogados

O escritório de advogados associados Zanão e Poliszezuk Advogados (http://zp.adv.br/) foi fundado na capital paulista em 1999 por Fábio Lemos Zanão e Marcos Vinicius Poliszezuk. Atua nas áreas de Direito do Trabalho, Contencioso Cível e Comercial, Ambiental, Contratual, Tributário e Imobiliário, primando pelo atendimento personalizado de cada cliente. Em Direito do Trabalho, conta com diferencial marcado por cases de sucesso em Direito Coletivo do Trabalho.

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